sábado, 19 de outubro de 2013

A Aventura da Reportagem, livro para aprendiz

Capa | Skoob
O livro “A Aventura da Reportagem” é dividido em duas partes contando as experiências profissionais dos jornalistas Gilberto Dimenstein e Ricardo Kotscho. A apresentação é de Clóvis Rossi e não poderia ter ficado melhor – com um tom de seriedade e ao mesmo tempo de humor. 

A primeira parte é escrito por Dimenstein contando suas experiências no ambiente de política e disputas partidárias. Com suas experiências, ele aponta as várias condições e situações que todo repórter enfrente durante sua apuração. Todos os pontos estão subdivididos em tópicos.

A primeira lição apresentada por Gilberto Dimenstein é o off “a responsabilidade do off é de quem publica, não de quem produz informação falsa”. Depois o jornalista fala das armadilhas que existem. Mas comum na área da política. Entre os vários tópicos apresentados por ele, além das já apresentadas anteriormente são “fontismo” falando das fontes; “versões” onde ele deixa um ditado comum entre os políticos: “Em política, o que vale é a versão e não fatos”, mostrando que a veracidade no mundo da política é uma questão incerta.

Gilberto Dimenstein
Um outro tópico interessante é “deslizes” onde ele fala da apuração, os boatos e etc e diz que “a vítima foi parte da imprensa, que confiou demais e checou de menos”. Além de alertar para os boatos e falta de checagem, ele alerta para as mentiras e fofocas.

Um dos tópicos mais interessantes de Gilberto Dimenstein é “investigação”. Neste tópico ele conta que a falta de fontes para denunciar alguma falcatrua faz o repórter começar uma investigação.

A segunda parte do livro é escrita por Ricardo Kotscho. O perfil dele é diferente de Gilberto Dimenstein em política. Como fala Clóvis Rossi na apresentação do livro, Ricardo Kotscho “especializou-se em contar histórias dos anônimos, das pessoas e dos lugares que raramente entram nos jornais, rádios e televisões”.

A vantagem do jornalista Kotscho é que ele veio de uma família alemã. Com a dominação da língua alemã, Kotscho conseguiu, além de traduzir notícias, fazer matéria fora do país e assim, conseguir alguns furos de reportagens e escrever matérias diferenciadas.
Ricardo Kotscho
Desde sempre Ricardo Kotscho gostava de ler jornais. Ao se tornar jornalista, aguçou sua percepção. Diferente de outros repórteres, Ricardo tinha um olhar incomum – “Meio por necessidade de fazer algo diferente, meio por sacação, já que a imprensa sempre se ocupava dos mesmos personagens, civis ou militares, oficiais sempre, fui falar com o povo”. 

Assim, o jornalista foi conseguindo matérias e informações por meio de sua “sacação”. Essa foi a melhor lição na história de Kotscho – jornalista tem que ter percepção, agir além daquilo que é mandado fazer.

É possível observar que o livro “A Aventura da Reportagem” escrito por Gilberto Dimenstein e Ricardo Kotscho traz várias lições de experiências para o jovem estudante de jornalismo ou o jovem repórter. É uma leitura simples com uma narrativa tranquila e, ao mesmo tempo que ela é divertida, ela consegue passar muitos aprendizados.

domingo, 13 de outubro de 2013

"Por favor, visitas não"


...durante as longas férias das escolas superiores chegam bandos de estudantes, em parte rapazes simpáticos e interessantes, mas assim em massa não os suporto. Fazem "trabalho de campo" por algumas semanas, depois passam ainda umas férias na Suíça, visitam de carona todos os lugares famosos e também homens famosos. Ficam parados aqui quase todos os dias a toda hora, riem da inscrição "Por favor, visitas não" no portão da minha casa, assaltam-me nos cantos mais ocultos do meu jardim, e já por três vezes provocaram neste velho eremita ataques de fúria, que depois deixaram por horas a fio taquicardia e terrível dor de cabeça....


Retirado do livro Correspondência Entre Amigos, de Hermann Hesse e Thomas Man

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Amar, Verbo Intransitivo - Mário de Andrade



Não me sinto na liberdade para falar dessa obra magnífica de Mário de Andrade. Não é uma leitura simples, é uma leitura que você tem que ir se acostumando, como diz o próprio escritor no posfácio: "A língua que usei. Veio escutar melodia nova. Ser melodia nova não quer dizer feia. Carece primeiro de se acostumar. [...]"

O livro foi publicado em 1927 e conta a estória da iniciação sexual do adolescente Carlos com Fraülein, mulher alemã contratada pelo pai de Carlos, Sousa Costa.

Só quero ressaltar aqui, o quanto eu gostei da intromissão de Mário na obra. Ele tinha autoridade para, em um parágrafo ou outro, conversar com o leitor e discutir narrativa e enredo. Ele coloca seu dedo lá sempre. E não foi ruim, foi lindo, foi original e digo mais - foi essencial. Esse xereta que é o escritor, tornou a leitura muito mais divertida quando quis ponderar algumas situações.

E agora, pra quem quer ter uma resenha bem escrita, sugiro que vá na página da Fernanda.

Vou deixar aqui a análise crítica do SOS Estudante:
"Mário de Andrade apresenta em seu romance uma situação que, como todos sabem ,é bastante objetiva: uma família, para proteger seu filho de eventuais aventuras, decide contratar uma professora que lhe dê as primeiras lições de amor. Isto é objetividade pura. Mas também é ignorância familiar, que não sabe calcular as conseqüências.
Mas, se o quadro das funções ou dos papéis está tão objetivamente distribuído, o quadro da intimidade vai apresentar uma dimensão até certo ponto contrastante com o esquema básico do livro. Porque é estranho que a professora, depois de tanta experiência ainda se apaixone e tenha ciúmes inexplicáveis. Sobretudo se lembrarmos o modo com Fräulein serena, fria e germanicamente costuma cumprir com suas obrigações. Mário de Andrade, como sabemos, tentou defender sua personagem da acusação de contraditória. E se justifica com base em psicologia moderna, sobretudo Freud. Aliás, as intervenções psicologistas do narrador são uma das características centrais do livro. E nem sempre são bem sucedidas. Elas de certa forma demonstram que a ação não se sustenta por si mesma, e que a narrativa está pedindo socorro teórico. Outro dos caminhos que Mário de Andrade escolheu para fugir da pobreza espiritual da família média paulistana, bem como a limitação natural do assunto, foi a exploração do imaginário de Elza. E, ao que parece, esta é a parte que mais me convence no livro. Porque sob esse aspecto, Mário consegue realmente criar a impressão de uma figura humana comovente. Não quando Elza age. Mas quando Elza tem seus escapismos, quando pensa num casamento na Alemanha, quando hesita entre o espírito e a prática, quando se sente humilhada, quando tem suas raivas, quando fica entre ir embora ou permanecer".


Curiosidade: O filme Lição de Amor, de 1975, com Lilian Lemmertz é baseado no romance.

Alguns trechos:

"É coisa que se ensine o amor? Creio que não. Ela crê que sim. Por isso não foi no jardim, deve se guardar. Quer mostrar que o dever supera os prazeres da carne, supera. Carlos desfolha uma rosa. Sob as glicínias da pérgola braceja de tal jeito que o chão todo se pontilha de lilá." - pag. 65

"Fräulein tinha poucas relações na colônia, achava-a muito interesseira e inquieta. Sem elevação. Preferia ficar em casa nos dias de folga relendo Schiller, canções e poemas de Goethe. Porém com as duas ou três professoras a que mais se ligava pela amizade da instrução igual, discutia Fausto e Werther. Não gostava muito desses livros, embora tivesse a certeza que eram obras-primas." - pag. 67

"Não se discute: os estigmas do pecado alindam qualquer cara. Carlos hoje está quase bonito, desse bonito que pega fogo nas mulheres. Até nas virgens, apesar do físico perfeito de Peri e do moçoloiro. Carlos estava assim com um arzinho sapeca, ágil, um arzinho faz-mesmo. Não se moçoloirara nem um pouco. Porém se cantava satisfeito parou a desafinação de repente, malestar... Berimbaus guisos membis, as meninas voltavam do passeio. Fräulein devia estar com elas. Ficaram no jardim." - pag. 101

"Vieram correndo em busca dos amantes, os tempos de intimidade. A gente nem respira e a vida já fica tão de ontem! É esquisito: o amor realizado se torna logo parecido com amizade... Carlos já senta-se e cruza as pernas. Se fumasse, fumaria. E sempre o mesmo ardente, o mesmo entusiasmo... Mas porém cruza as pernas, que é sintoma de amizade. Talvez mesmo pra evitarem o excesso de camaradagem, que traz os dizque e conta os casos desimportantes do dia, eles falam unicamente de amor. Não é por isso não. Fräulein tem de ensinar e ensina, Carlos até pouco fala. Geralmente ele apenas termina os raciocínios da sábia e se deita na sombra mansa das ilações. Carece aprender e aprende." pag. 102

"Carlos carecia de reconhecer que no amor, sem sacrifício mútuo não tem felicidade nem paz, não é?" - pag. 117

"Quais seriam as tendências de Laurita? Porém os pais não se preocupavam muito com as predisposições, ponhamos, artísticas da outra filha. São sempre assim os pais: quando as esperanças se projetam sobre um filho, o resto são sombras mal reparadas. Que vivam, e Deus os abençoe! Amém." - pag. 118

"Ponhamos Carlos de lado, o caso dele é mais particular. Está contente porque Fräulein está contente. O alegra estar junto da amante, só isso. E amor satisfeito, entenda-se, senão dava em poeta brasileiro." - pag. 119

"À sombra do sabugueiro / Sentávamos de mãos dadas, / Éramos no mês de maio / As criaturas mais felizes deste mundo" - pag. 141